segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Pinoquiolândia

                 
É mais difícil mentir do que dizer a verdade. Mentir exige uma atitude mental suplementar, acelera o ritmo cardíaco e o metabolismo, força a adopção de uma forma teatral
Este fenómeno teria justificação no facto da mentira bons dividendos, a julgar pela subida social e económica dos que mentiam.
Quanto mais alto se subisse na escala social, política e financeira, maior eram as mentiras. E a multidão dos mentirosos aumentava, aumentava, ao povo da minoria dos que falavam a verdade ser vista com maus olhos, como sendo uma seita desestabilizadora e subversiva.
Não tinham da vida a noção da acumulação exacerbada da riqueza nem admitiam que o Poder fosse um meio de enriquecimento.
Não tardou que a multidão mentirosa, enraivecida pelas críticas cada vez mais agudas desta minoria, os expulsasse da sociedade, obrigando-os a viver em desterro, longe dali.
Poucos dias depois, algo de estranho acontecia: de cada vez que dizia uma mentira, o nariz do mentiroso crescia um pouco. E começou a ver-se por todo o lado enormes narigões que não paravam de crescer, porque ninguém parava de mentir. E os narizes iam crescendo, crescendo, até se tornarem insuportáveis, inestéticos, aberrantes. Até que, um dia, uma estranha moléstia apareceu com sintomas de asma, bronquite, tosse, sinusite, falta de ar, enfraquecimento, insuficiência cardíaca, etc.
Mas havia um contra: se continuassem a mentir, os narizes decepados continuariam a crescer. Mas os mentirosos não quiseram saber: exilaram de novo os que não mentiram, e continuaram com a mesma vida de mentira que os tinha deformado. E foi o que se viu: por todo o lado e abriram as clínicas onde se procedia à cirurgia periódica de narizes, como se fossem barbearias, onde se cortavam os narizes como o cabelo ou a barba.
Queriam construir a sua nova sociedade, onde a mentira não tivesse entrada, pois sabiam, mais tarde ou mais cedo, a sociedade que os exilara cairia em desgraça, apodreceria no seio da sua própria degradação.
Nuno Costa, em 03/09/2012

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